Algumas pesquisas indicam que a melhor maneira de fixar o conhecimento no seu cérebro é escrever seus textos ou anotações de estudo à mão ao invés de digitá-los no computador.
Um estudo de 2014 chamado “A Caneta É Mais Poderosa Que o Teclado“, conduzido pelos pesquisadores Pam A. Mueller, da Universidade de Princeton, e Daniel M. Oppenheimer, da Universidade da Califórnia, Los Angeles (UCLA), é amplamente citado por ser pioneiro na temática.
Esta pesquisa mostra que escrever notas à mão permitiu que os participantes retivessem melhor a informação do que aqueles que digitaram em um laptop, mesmo que o primeiro grupo tenha escrito menos palavras que o segundo.
É assim mesmo? E se for, por que escrever à mão é mais eficaz do que digitar no computador quando o objetivo é reter informações com mais eficácia?
Escrever é melhor que digitar?
Sempre achei que digitando consigo acompanhar com mais facilidade o ritmo do meu pensamento. Além disso, se a situação se trata de fazer anotações de uma palestra, digitando consigo elaborar notas muito mais volumosas e completas. É quase possível elaborar um manuscrito da palestra.
No entanto, o estudo acima mencionado relata que quando fazem anotações à mão, os estudantes desenvolvem uma compreensão conceitual mais forte em comparação a digitar.
Como assim? E por quê?
O estudo de Mueller e Oppenheimer e os resultados obtidos
Durante a pesquisa, foram conduzidos três experimentos nos quais alunos fizeram anotações em uma sala de aula. Metade dos alunos usou um laptop, enquanto a outra metade escreveu à mão.
Posteriormente, os pesquisadores testaram qual dos dois grupos teve melhor resultado em entender e gravar a matéria na memória.
O resultado não os surpreendeu – os alunos que utilizaram o laptop conseguiram realizar mais anotações. No entanto, embora registrassem menos informações, nos três experimentos os alunos que escreveram à mão foram mais bem-sucedidos em compreender e assimilar o assunto.
Por quê?
Os pesquisadores acreditam que isso tem a ver com o fato de que ao digitar, os alunos com laptops escreveram palavra por palavra do que o professor estava dizendo sem pensar sobre o que estavam aprendendo.
Como a escrita à mão é mais lenta e cansativa, torna-se mais difícil anotar tudo ao pé da letra. Portanto, é necessário processar a informação e resumí-la de uma forma que faça sentido, nos obrigando a sermos mais seletivos em nossas notas.
E para sermos mais seletivos, é obrigatoriamente necessário dar detida atenção às informações para, na sequência, processá-las, relacioná-las a anteriores aprendizados e sumarizarmos tudo isso em curtas frases ou simplesmente palavras soltas jogadas no papel.
O estudo de Mueller e Oppenheimer abriu caminho para que outras pesquisas mais completas sobre o tema fossem desenvolvidas.
O que acontece no cérebro ao escrever à mão: benefícios para a memória e aprendizagem
Pesquisas posteriores realizadas por cientistas no Japão, na Noruega e nos Estados Unidos constataram a mesma coisa – no processo de aprendizagem, escrever é melhor que digitar.
Robert Wiley, professor de psicologia na Universidade da Carolina do Norte em Greensboro, e Brenda Rapp, cientista cognitiva na Universidade Johns Hopkins, publicaram um estudo em 2021 envolvendo 42 participantes aprendendo árabe.
Os pesquisadores observaram que os participantes que escreviam suas anotações à mão no papel aprendiam as letras árabes mais rapidamente, lembravam dos nomes das letras e eram melhores em pronunciar as letras recém-aprendidas do que os participantes que tentavam aprendê-las digitando ou apenas olhando para elas.
Audrey van der Meer e Ruud van der Weel, ambos professores de neuropsicologia na Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia (NTNU), estavam curiosos sobre as diferenças na atividade cerebral entre as duas abordagens de anotações.
Então, em 25 de janeiro de 2024, publicaram um estudo na Frontiers in Psychology para contar suas descobertas.
Para o estudo, 36 alunos usaram eletrodos e 256 sensores que registravam a atividade cerebral enquanto digitavam e escreviam manualmente 15 palavras exibidas em uma tela do jogo Pictionary.
Quando escreviam as palavras à mão, os sensores indicavam uma conectividade generalizada em muitas regiões do cérebro, como as áreas que recebem e processam informações sensoriais, movimento e integração sensoriomotora, que é quando usamos informações do ambiente para decidir nossa próxima ação.
No entanto, havia pouca ou nenhuma atividade cerebral nas mesmas áreas para os alunos que digitavam as palavras.
“Quando você digita, o mesmo movimento simples dos dedos está envolvido na produção de cada letra, enquanto, ao escrever à mão, você sente imediatamente que a sensação corporal de produzir um A é completamente diferente de produzir um B”, explicou Audrey van der Meer.
Além disso, os pesquisadores também identificaram oscilações alfa e teta ativas no cérebro durante o processo de escrita à mão, atividade cerebral benéfica para o aprendizagem e a memória.
Somadas aos benefícios cognitivos, a escrita a mão também está associada a outras vantagens.
Habilidade motora e criatividade

Canetas e teclados acionam processos muito diferentes. “A escrita à mão é uma tarefa complexa que requer várias habilidades – sentir a caneta e o papel, mover o instrumento de escrita e dirigir o movimento através do pensamento”, diz Edouard Gentaz, professor de psicologia do desenvolvimento na Universidade de Genebra.
“As crianças levam vários anos para dominar este exercício motor preciso de segurar a ferramenta de escrita firmemente enquanto a move de forma a deixar uma marca diferente para cada letra”, completa ele.
Operar um teclado, por outro lado, é bem diferente: tudo o que você precisa fazer é pressionar a tecla correta. É fácil o suficiente para as crianças aprenderem muito rapidamente, contudo, o movimento é exatamente o mesmo, qualquer que seja a letra.
Roland Jouvent, chefe de psiquiatria de adultos do hospital Pitié-Salpêtrière em Paris, expressa isso de uma maneira inequívoca: “Há um elemento de dança quando escrevemos, uma melodia na mensagem, que adiciona emoção ao texto. Afinal, foi por isso que os emojis foram inventados, para restaurar um pouco de emoção nas mensagens de texto.”
Claire Bustarret, especialista em manuscritos de códice no centro de pesquisas Maurice Halbwachs, em Paris, concorda e completa raciocinando que ao digitar no computador você pode sim alterar o layout da página e a fonte do texto. No entanto, a liberdade gráfica concedida pelo papel é muito maior: você pode escrever em ambos os lados da folha, manter as margens definidas ou não, sobrepor linhas ou distorcê-las, e até compor formas ilógicas e incompreensíveis enquanto seu cérebro divaga. Sem falar que o papel é multidimensional – pode ser dobrado, recortado, grampeado ou colado.
Um texto eletrônico, além disso, não deixa as marcas do processo criativo que são evidentes na escrita manual. Quando você digita no computador, é possível alterar o conteúdo quantas vezes quiser e ninguém saberá das correções que o texto sofreu até chegar no formato final. Com caneta e papel, por outro lado, está tudo ali. Palavras riscadas ou corrigidas, rabiscos à margem e adições posteriores permanecem para sempre, deixando um registro visual e tátil do seu trabalho e das suas etapas criativas.
Intimidade e personalidade
Não podemos deixar de mencionar e, é claro, exaltar que a escrita sempre foi vista como uma expressão de nossa personalidade.
Em seus livros, o historiador Philippe Artières explicou como médicos e detetives, no final do século XIX e início do século XX, encontravam sinais de desvio entre lunáticos e delinquentes simplesmente examinando a maneira como formavam suas letras.
“Com a caligrafia, chegamos mais perto da intimidade do autor”, explica Jouvent, mencionado anteriormente. “É por isso que somos mais fortemente comovidos pelo manuscrito de um poema de Verlaine do que pela mesma obra simplesmente impressa em um livro. A mão de cada pessoa é diferente: o gesto é carregado de emoção, conferindo um charme especial.”
Escrever à mão, portanto, não é apenas uma prática tradicional, mas uma ferramenta poderosa para a aprendizagem e a memória. Escrevendo no papel e na caneta comprovadamente você terá uma melhor retenção e compreensão do conteúdo, integração sensorial e a criatividade.
Enquanto a tecnologia continua a avançar, é importante não subestimar o valor da escrita manual. Seja para estudar, criar ou simplesmente organizar pensamentos, pegar uma caneta e papel pode ser a chave para um aprendizado mais eficaz e uma expressão mais autêntica.
Portanto, da próxima vez que você estiver diante de uma escolha entre escrever à mão ou digitar, tente dar uma chance para a caneta.