Sem passar panos quentes, qual é a fama dos franceses?
Mesquinhos e esnobes, certo?
Esse estereótipo francês é tão difundido ao redor da Europa que tem uma piada que diz que a única coisa que os europeus tem em comum é o alívio de não terem nascido na França.
Os franceses realmente são assim, meio rudes e frios? Se a resposta for afirmativa, o que moldou esse jeito francês de ser?
Tenho ótimas respostas para compartilhar! 😁
Como é a personalidade dos franceses?
A França é um país onde habitam cerca de 67 milhões de habitantes, cada um com sua personalidade formada de acordo com a região onde vive, sua história individual e sua classe social.
Mas o que as pessoas, no geral, pensam sobre os franceses?
Uma ideia comum e bem difundida não só no Brasil, mas ao redor do mundo, é que os franceses são arrogantes e um tanto quanto presunçosos, especialmente os parisienses, que supostamente olham os estrangeiros de cima para baixo.
Os americanos e britânicos têm até um nome para isso, “síndrome parisiense”.
Relatos de metrôs lotados em Paris frequentemente mencionam franceses que não cedem espaço ou respondem mal a perguntas. Um expatriado no blog “The Local France” (2024) desabafou: “Como americano vivendo em Lyon, inicialmente me choquei com a falta de sorrisos ou conversa fiada. Perguntei direções a um homem no trem e ele apenas apontou, sem uma palavra. Parecia frio e arrogante.”
Muitos dizem que os franceses são um tanto quanto grosseiros porque quando precisam falar alguma coisa vão direto ao ponto, sem muitos rodeios.
Características típicas como não sorrir para estranhos ou corrigir pronúncias são vistas por muitos como hostilidade.
Por exemplo, em um fórum da Reddit, um usuário postou em 2023 sobre uma viagem a Paris: “Fui a um café e o garçom mal olhou para mim. Quando pedi em inglês, ele revirou os olhos e respondeu de forma curta. Senti que eu era um incômodo.”
Uma blogueira brasileira, em seu site de viagens (como o “Viagens Cine”), descreveu em 2022: “Em uma loja de souvenirs, a vendedora me corrigiu asperamente quando errei a pronúncia de ‘merci’, fazendo-me sentir humilhada. Parece que eles esperam que todos falem francês perfeito.”
Todos estes relatos se alinham com estudos como o do Pew Research Center, que nota que estrangeiros percebem os franceses como menos “amigáveis” em comparações internacionais.
No seu livro “Almost French”, a autora australiana Sarah Turnbull descreve sua luta para se integrar em Paris da seguinte forma: “Os franceses parecem ter uma hierarquia; se você não fala francês fluente, é como se fosse invisível.”
Pois é . . . aparentemente o jeito de ser dos francês não está caindo na graça do povo em geral.
Pesquisando sobre a personalidade dos franceses, encontrei vídeos de uma produtora de conteúdos parisiense, a Lucile, que contou detalhes interessantes sobre a ótica francesa desta temática.
Para você, o que faz de alguém uma pessoa respeitosa?
É alguém que cumprimenta as pessoas, que pergunta como está sua família, que cede espaço no ônibus e que pede desculpas ao esbarrar?
Curioso como o conceito de respeito varia de cultura para cultura e o senso de respeito para os franceses pode contar detalhes reveladores sobre o jeito deste povo.
O que é ser bem educado para um francês?
Antes de elaborar este tópico, é digno de nota mencionar que até mesmo os franceses de outras cidades da França acham os parisienses rudes e grosseiros.
Por que eles são assim?
Cabe mencionar que Paris é uma cidade muito grande. Há cerca de 12 milhões de pessoas vivendo nos arredores de Paris. Além disso, é uma cidade muito lotada e movimentada. Não bastasse os milhões de habitantes, consideremos que no decorrer do ano inteiro há uma superpopulação de turistas visitando a cidade. São nada mais que 50 milhões de estrangeiros visitando Paris anualmente. A Cidade Luz costuma estar entre as cinco mais visitadas do mundo.
Se visitarmos Paris, portanto, é preciso ter em mente que o local tem esse ritmo frenético, tal como acontece com outras grandes metrópoles, como Nova York, e que isso tem grande impacto e interferência nas pessoas que lá habitam.
Alguns cientistas sociais, como Stanley Milgram, falam sobre um fenômeno chamado “síndrome urbana”, em que moradores de grandes cidades desenvolvem uma certa indiferença emocional, muitas vezes como um mecanismo de autodefesa para lidar com o excesso de estímulos.
Além disso, a França tem uma cultura muito forte. Pessoas que nascem e crescem na França estão num ambiente em que tudo gira em torno da França. Todos os filmes são dublados em francês, existem muitos filmes, livros, músicas e comidas feitas para o povo francês, enfim, eles são bem nacionalistas e esperam que nos adaptemos à sua cultura quando visitamos o país.
Aliás, o que você acha sobre isso? Esta parte de nos moldarmos à cultura local ao viajarmos para algum país eu acho apropriado e respeitoso.
Existem algumas regras não ditas que fazem parte do código social para uma boa convivência com os franceses. Vou te contar:
1. Sempre cumprimente antes de iniciar uma interação
Os franceses esperam e quase que exigem um Bonjour ao serem abordados. Se não lembrar do cumprimento em francês, pode falar um “Olá” em inglês, mas não deixe de começar a interação desta maneira, caso contrário, você estará sendo rude para pelos padrões franceses e eles não irão disfarçar seu incômodo pela falta desta saudação. Muitas pessoas relataram uma experiência positiva com os parisienses apenas por lembrarem deste pequeno ato de educação.
Um relato no TripAdvisor (2024) de um casal português diz o seguinte: “Inicialmente, achamos os parisienses frios, mas ao usar francês básico, eles se abriram. É cultural – eles valorizam esforço.”
Existe até mesmo um livro cujo título é “The Bonjour Effect”, de Julie Barlow e Jean-Benoît Nadeau. Ele mostra exatamente o poder que uma saudação tem de transformar interações rudes em contatos amigáveis.
2. Atente à forma como você age no transporte público
O transporte público, especialmente o metrô, pode ser uma grande fonte de frustração para os parisienses. Como comentado anteriormente, Paris é abarrotada de pessoas e, evidentemente, o metrô desta cidade é bem lotado – há registros de ser o nono metrô mais movimentado do mundo.
Esse tipo de situação exige que você respeite o espaço pessoal das outras pessoas.
Qual deve ser o comportamento dos turistas no metrô se querem deixar o coração dos parisienses calmo e sereno?
Você deve andar rápido o suficiente, não ficar parado no caminho onde ocorre o fluxo de pessoas e permanecer do lado direito das escadas rolantes caso não estiver se movendo.
Se você quebrar alguma dessas “regras”, fique tranquilo que os franceses vão deixar você saber. 😁 Eles vão passar por você e dizer “pardon”, que significa “com licença”, de um jeito meio sarcástico. Você provavelmente não vai gostar de receber essa advertência, mas para os franceses é normal informar quando estão se sentindo incomodados. Vamos falar mais sobre isso daqui a pouco.
3. Atenção ao interagir com prestadores de serviços
Para os franceses, as pessoas que entram numa loja ou num restaurante são os convidados do estabelecimento.
O que significa ser um convidado?
Significa que você deve permitir que o anfitrião assuma a liderança e lhe diga o que fazer.
Isso pode ser muito diferente de outros países, onde os funcionários muitas vezes são tratados como “servos”, por assim dizer.
Na França esse tipo de tratamento não é tolerado e pode ter certeza que se não seguir esse protocolo você não será tratado com gentileza. Nos restaurantes, os garçons não dependem das gorjetas, então eles não vão te bajular.
Como ser um bom convidado, então?
Algo extremamente valorizado é, novamente, o cumprimento ao chegar no local. Lembre-se sempre das palavras-chave, bonjour e merci. E eles estão certos, concorda?
Além disso, ao chegar em um restaurante, não vá logo escolhendo o lugar onde você irá se acomodar. Deixe que o garçom irá te guiar.
Sobre o momento de fazer o pedido, quem já visitou Paris talvez se identifique com uma turista que deixou o seguinte comentário numa rede social:
“Fui a um restaurante em Paris (. . . ) e tive uma experiência muito ruim. Eu estava apenas pedindo ao garçom que nos desse cinco minutos para decidir o que pedir, mas ele apenas disse: “No English, only French”. Eu tentei explicar, mas ele foi muito rude, e literalmente tive que me levantar e sair do restaurante.”
Constrangedor, não é mesmo?
Sim, grandes desentendimentos podem acontecer quando os turistas não falam francês e o garçom não fala inglês. Nestes casos, é comum o garçom ficar confuso e te olhar com uma cara estranha que você poderá interpretar como rude, mas acredite, isso é totalmente normal na França.
Luciele, a influenciadora francesa de quem comentei antes, recomenda que você permaneça paciente e não espere que os atendentes falem em inglês. Na pior das hipóteses, use o método universal de apontar para algum prato que outra pessoa esteja comendo e dizer que quer aquilo.
Se você subir o tom de voz o garçom achará que você está sendo agressivo e ele vai reagir, porque é totalmente aceitável “dar o troco” na mesma intensidade do comportamento do cliente.
Polidez é diferente na França
Talvez o grande segredo de entender o jeito de ser dos franceses esteja em saber que “polidez” para os franceses têm um significado diferente em relação aos outros países.
Ser educado na França não significa ser amigável, nem ser legal. Tem a ver com manter a distância apropriada nas interações sociais.
Vou te dar um exemplo.
Se um turista vem para o Brasil ou mesmo nas nossas interações do dia a dia, é normal passarmos boa parte do tempo conversando, certo? Queremos saber como a pessoa está, perguntamos sobre a vida e as experiências dela ou até mesmo jogamos conversa fora.
Esse tipo de conexão pode deixar um francês desconfortável, fazendo-o se sentir sufocado.
Os franceses estão acostumados com as pessoas menos próximas os cumprimentando com um bonjour e depois seguindo o seu caminho. Isso porque eles valorizam bastante o seu espaço pessoal, lembra?
Na França, a proximidade entre as pessoas segue certa hierarquia. Lá não é comum falar da mesma forma com alguém que você verá apenas uma vez da mesma forma como você fala com seus familiares e seus amigos.
Se você abordar as pessoas de maneira excessivamente amigável, fazer perguntas pessoais ou jogar conversa fora; ao invés de te achar simpático, é provável que elas te achem um pouco exagerado ou meio maluco ou falso. E, para os franceses, ser visto como falso é algo muito negativo.
Por exemplo, na França, você não faz perguntas para as quais não quer realmente ouvir a resposta. Se alguém chega a uma loja e pergunta ao atendente “Ça va?”, que significa “Tudo bem?^, a pessoa vai pensar que está com cara de doente ou que tem sangue escorrendo pelo seu nariz. O “tudo bem” remete uma ideia de preocupação, então, diferente de outras culturas, não é apropriado entre estranhos e não é visto como um ato de simpatia.
Além disso, na França não é comum ficar sorrindo o tempo todo e eles acham que corrigir turistas que pronunciam palavras em francês de forma errada é uma forma de ajudá-los, e não necessariamente uma crítica.
Pode ser que visitantes ou imigrantes tenham dificuldades em interagir no início. Na França, amizades são vistas como algo de longo prazo. Elas levam mais tempo para acontecer, mas o lado positivo é que, quando acontecem, elas são para sempre se você continuar mantendo o contato.
Algo que pode ser uma resposta para a aparência rude dos franceses é o valor que eles dão para a honestidade e a autenticidade. Eles consideram isso essencial para o desenvolvimento de amizades.
Quem de nós nunca disse: “Imagina, você está linda” quando uma amiga se queixou da aparência e, apesar de concordar, você não falou sua real opinião por receio de magoá-la?
Os franceses não usam esse jogo de palavras. Eles são francos e honestos. Apesar de por vezes a sinceridade poder causar um choque, quando for um elogio, você terá certeza que é genuíno.
Uma França desconhecida
Por outro lado, há pessoas que visitaram a França e descreveram os franceses como charmosos, cultos e acolhedores.
Lembra dessa historinha aqui, que revela como nossa atitude pode transformar o lugar que visitamos? Isso é relevante para construirmos boas experiências.
Além disso, se você visitar cidades menores, o acesso à esses franceses calorosos será maior. Viajantes que vão para Provence, Normandia ou Alsácia frequentemente tem bons relatos para contar.
Um post no Reddit de um turista canadense diz assim: “Em uma vinícola em Bordeaux, o dono nos recebeu como família, oferecendo queijos e vinhos grátis enquanto contava histórias. Eles foram incrivelmente gentis e interessados na nossa cultura.”
Também, uma família brasileira contou que, durante sua estadia em um Airbnb em Côte d’Azur, os anfitriões cozinharam uma refeição tradicional e ensinaram francês básico, fazendo-os se sentirem “em casa”.
No livro “My Good Life in France” de Janine Marsh (2017), a autora britânica narra que após superar barreiras iniciais, encontrou franceses passionais e leais: “Eles debatem tudo com fervor, mas é sinal de respeito. Uma vez amigo, é para sempre.”
Um brasileiro que trabalha como profissional de TI em Toulouse, na França, comentou que também gosta de interagir com os franceses: “Meus colegas franceses me convidaram para jantares longos, discutindo arte e política. Sua sofisticação me inspirou e o ‘savoir-vivre‘ é real – eles sabem viver bem!”
Um vídeo no TikTok de 2023 de uma influenciadora mexicana viralizou ao mostrar franceses em um mercado de rua em Nice dançando e compartilhando comida: “Eles são românticos e divertidos! Esqueci completamente o estereótipo de rudeza.”
De fato, estudos como o do World Values Survey (até 2023), indicam que, em contextos não-turísticos, os franceses são vistos como generosos e cultos.
A França tem uma tradição de orgulho nacional, pense na Revolução Francesa e no Iluminismo como foram fortes eventos para identidade francesa. Além disso, os franceses dão ênfase em “art de vivre” (arte de viver), que prioriza qualidade sobre quantidade, levando a interações mais reservadas. Tais aspectos podem ser vistos como arrogância, mas talvez tenham mais a ver com a cultura estabelecida.
Sim, há toneladas de relatos que confirmam tanto estereótipos de rudeza como de hospitalidade dos franceses. Como a nossa atitude interfere diretamente no tratamento que recebemos, algo que nunca falha é nos adaptarmos à cultura local, relembrarmos do histórico do país e não levarmos os outros e nós mesmos tão à sério. E você, o que acha de tudo isso?
