O cérebro de um cachorro

A linguagem corporal, o olfato e forma como os cães interagem com os humanos e com criaturas de outras espécies nos ensinam muito sobre o que se passa no cérebro de um cachorro.

Vivemos num tempo em que o ser humano tem levado diversas espécies à extinção.

Existem espécies, porém, que descobriram como se dar bem com as pessoas. Os cães são o exemplo número um nisto.

Estima-se que existam mais de 800 milhões de cães no nosso planeta, e mais da metade deles são de estimação.

O que se passa pela cabecinha destes encantadores e amáveis seres que ganharam nossos corações e nossas casas?

A linguagem corporal dos cachorros

Surpreendentemente, o cão foi o primeiro animal domesticado. É o que conta Stanley Coren, autor do livro The intelligence of dogs, sem tradução para o português. Nossos ancestrais tinham vários animais herbívoros à sua volta, como ovelhas e cavalos. E mesmo assim, foram dos cachorros que se aproximaram.

Os cães fizeram algo extraordinário: eles descobriram como se comunicar conosco.

Entendemos claramente a linguagem corporal de nosso cachorrinho depois de conviver um tempo com ele.

Alguns pesquisadores indicam que podemos decifrar o que está se passando na cabeça dos cachorros através da forma como latem.

“Quando os cães vocalizam, na verdade expressam diferentes tipos de estados internos”, diz o etólogo Ádám Miklósi. “Eles tentam comunicar algo sobre suas emoções.”

Coren ensina que se o latido tem um tom alto, temos então um cachorro feliz. Se o latido for mais baixo, estamos diante de um cão de guarda. Se o cachorro late muito, ele está sinalizando estresse ou animação. Há um certo tipo de latido que indica um chamado a matilha, como que dizendo: “Venham aqui e vejam isto.”

A cauda ou rabo do cachorro é um termômetro emocional que serve para dizer como ele está sentido.

Se o rabo está alto, o cachorro está na posição dominante. Rabo baixa indica que ele está com medo.

Quando o cão abana a cauda de forma rápida, quer dizer que está animado; de forma lenta, está preocupado.

Você também pode obter muitas informações nas orelhas: orelhas altas voltadas para as laterais indica estado agressivo; orelhas para baixo quer dizer submissão; e, orelhas altas voltadas para frente é indicativo que seu cachorro está relaxado.

O olfato dos cachorros

Os cães foram criados para entender o mundo pelo cheiro e pelo focinho.

A Dra. Cynthia Otto, diretora do Penn Vet Working Dog Center, dos Estados Unidos, explica que, quando os cachorros inalam um odor, o ar não vai só para os pulmões. Parte do ar se armazena numa parte específica de detecção de odores que fica no nariz dos cães. Isto permite que eles corram e farejam ao mesmo.

Dependendo da raça, o olfato de um cachorro é cerca de 10.000 a 100.000 vezes melhor que o nosso.

Segundo algumas estimativas, 35% do cérebro de um cão é dedicado ao olfato, em comparação com 5% dos humanos.

É por isso que os cães têm sido usados ​​há séculos para farejar bandidos, explosivos e drogas, encontrar vítimas de avalanches e resgatar indivíduos presos sob edifícios. Nos últimos anos, eles foram treinados para detectar câncer e COVID-19.

Os cães, observa Wilson, também usam o olfato para controlar o tempo. Eles podem dizer a diferença entre um odor que existe há doze ou quatro horas. É assim que eles sabem quando é hora de sair para passear e quando seu dono deve chegar do trabalho. 

É um comportamento típico de nosso cães ficar à procura do cheiro do xixi de outro cachorro durante os passeios.

Por que eles fazem isto?

A Dra. Otto chama isso de “xixi-mail”.

Quando algum cachorro cheira o xixi de outro, ele recebe informação sobre quem esteve ali e como se sentia.

Através de umas simples fungadas eles conseguem descobrir a idade do outro cão, o sexo, o humor, a saúde, a disponibilidade para acasalamento e até se eles já se encontraram antes!

Incrível, não é?

Clive Wynne, autor de Amor canino: como e por que seu cachorro te ama, conta outros detalhes interessantes sobre a capacidade dos nossos cães leram camadas extras do mundo que conhecemos.

Por exemplo, ao andar pela sala de sua casa, uma mulher pode notar que uma planta precisa ser regada, que o marido passou a tarde inteira no sofá pela forma como as almofadas estão desarrumadas e, ao contemplar cheiro de comida vindo da cozinha e seu marido operando o forno, conclui que ele está cozinhando.

E um cachorro? Que leitura ele faz andando pelo mesmo espaço?

Ele sabe que a planta aparentemente murcha tem uma doença. Ele percebe que há percevejos no sofá. Sabe também que sua tutora está menstruada, que seu tutor está fazendo algo com ovos, extrato de baunilha e farinha. Além disso, sabe que ele está tendo uma crise de pânico de baixo nível.

Eu que achava que minha cachorra era burrinha, como fico depois dessa?

Sincronização com humanos

Um recente estudo explica a razão de os cães serem tão emocionalmente sintonizados com os humanos.

Uma equipe de pesquisadores fez com que voluntários assistissem a vídeos selecionados para aflorar sentimentos, como a parte assustadora de O Iluminado e cenas contagiantes e alegres de Mogli, o menino lobo. Durante o experimento, foi coletado o suor de tais pessoas.

O suor foi então entregue aos cães, que estavam ligados a monitores cardíacos.

Ao apresentarem o tubo de suor de medo a um cãozinho, sabe qual foi a reação dele? Se esquivou, caminhando para trás. Sua frequência cardíaca acelerou, ele baixou o rabo e foi para um canto da sala.

A outro cão foi apresentado o tubo de suor feliz.

Sabe como ele reagiu?

Ele começou a abanar a cauda e pular, como se quisesse brincar.

Tais comportamentos foram típicos na sequência do experimento – os cães pareciam refletir as emoções que os voluntários sentiram.

Em humanos, como chamamos esta sensação de compartilhar do sentimento de outro?

Sim, empatia. 💛

Se quiser saber mais sobre o amor que os cães sentem por nós, te indico esta leitura aqui.

Sincronização com outras espécies

A capacidade dos cães de se relacionarem com membros de outras espécies não se limita aos humanos, como qualquer dono de cachorro que também tenha um gato lhe dirá. 

Em seu livro de 2005, If Dogs Could Talk, Vilmos Csányi descreve um canino parecido com um bassê chamado Jumpy, cujos donos frequentemente cozinhavam ensopado de coelho, uma iguaria que Jumpy desfrutou durante anos. 

Então, numa Páscoa, eles obtiveram um coelho vivo que se tornou temporariamente o companheiro favorito de Jumpy. 

Quando transformaram aquele coelho em ensopado, Jumpy não apenas reconheceu e se recusou a comer seu novo amigo, mas também fez uma “greve de fome silenciosa e desanimada por três dias”, escreveu Csányi. 

Jumpy se recusou a comer carne de coelho desde então.

Bons juízes de caráter

Zachary Silver, que recentemente obteve seu Ph.D. em Yale e em breve abrirá um laboratório no Occidental College, recentemente usou pares de atores para testar a capacidade dos cães de fazer julgamentos de caráter. 

Um ator fingiria roubar uma prancheta ou prejudicar alguém ativamente, enquanto o outro seria mais amigável, entregando a alguém uma prancheta que ele procurava. Ambos os atores ofereceriam simultaneamente uma guloseima ao cão. 

Dos 37 cães testados, dois terços preferiram receber comida do simpático ator. 

Outros experimentos descobriram que os cães acabaram por parar de seguir as dicas de indivíduos humanos que muitas vezes os enganam.

“Os cães são muito parecidos com os humanos na forma como raciocinam sobre o mundo social”, diz Silver.

Para os donos de cães, isto não é novidade. 

Por exemplo, a maioria das pessoas que têm cães tímidos sabe que seus animais de estimação costumam observar de perto suas interações com estranhos e são mais propensos a fazer uma abordagem amigável com alguém depois de verem seu dono ter uma interação positiva. 

No entanto, eles parecem compreender que o relacionamento é diferente – eles nunca parecem querer ou esperar voltar para casa com amigos humanos, não importa quão familiares e amados sejam, se esses amigos não residirem com seus cuidadores principais.

Um mundo de amor

Quem é agraciado pelo convívio com estes incomparáveis seres apenas encontrou nestas linhas uma explicação científica para todas as constatações empíricas que faz diariamente de seu cãozinho – estamos diante de seres incrivelmente especiais!

Nos sentimos tão privilegiados como o simples poema Coração de Cachorro, de autor desconhecido, expressa:

Eu me dei conta
de que cada vez
que um dos meus cachorros parte,
ele leva um pedaço do meu coração com ele.

Cada vez
que um cachorro novo entra na minha vida,
ele me abençoa com um pedaço do coração dele.

Se eu viver uma vida bem longa, com sorte,
todas as partes do meu coração serão de cachorro.
Então,
me tornarei tão generosa e cheia de amor como eles.

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